02 novembro 2006




"Entre mim e as coisas
havia vizinhança"

Camilo Pessanha



I

Dentro da tua presença
Derretia-se o sol
Arrepiando os gatos,
Escurecendo as paredes.

A lareira ia consumindo as horas
E distribuía o seu brilho
Pelas pratas que areavas
Ocasionalmente aos Domingos.

No mais profundo vazio
O chão estremecia
Com os gemidos das árvores.
E era sempre noite.

As coisas justificavam-se
Sem palavras, e eram,
Para além da noite,
O que nos cercava.


II

No andar de cima
Já não há gritos.
Ouvia-se o silêncio,
Que estranho.

E tu chegavas
Com as folhas do Outono
E as rosas na varanda
Anunciavam o adeus.

E todas as coisas
Que nos eram mais próximas
Morriam gritando
P'la tua presença.

Esperavam
P'lo arrepio dos gatos
P'lo sol a derreter
Nos cantos da janela

E pelo ecoar das pratas no vasto salão.

Esperavam
Por um sinal,
Dentro da tua presença.


Texto: Ricardo Fernandes