
"Entre mim e as coisas
havia vizinhança"
Camilo Pessanha
I
Dentro da tua presença
Derretia-se o sol
Arrepiando os gatos,
Escurecendo as paredes.
A lareira ia consumindo as horas
E distribuía o seu brilho
Pelas pratas que areavas
Ocasionalmente aos Domingos.
No mais profundo vazio
O chão estremecia
Com os gemidos das árvores.
E era sempre noite.
As coisas justificavam-se
Sem palavras, e eram,
Para além da noite,
O que nos cercava.
II
No andar de cima
Já não há gritos.
Ouvia-se o silêncio,
Que estranho.
E tu chegavas
Com as folhas do Outono
E as rosas na varanda
Anunciavam o adeus.
E todas as coisas
Que nos eram mais próximas
Morriam gritando
P'la tua presença.
Esperavam
P'lo arrepio dos gatos
P'lo sol a derreter
Nos cantos da janela
E pelo ecoar das pratas no vasto salão.
Esperavam
Por um sinal,
Dentro da tua presença.
Texto: Ricardo Fernandes